Há julgados da 4ª Turma do TRF1 que consideram haver delito autônomo de falso quando o contribuinte de IR cai na malha fina do Fisco e junta ao procedimento de fiscalização documentos falsos - por exemplo, recibos -, para justificar deduções correspondentes a despesas não realizadas.
O entendimento da 4ª Turma funda-se na premissa de que a sonegação fiscal se consuma com a prestação de informação falsa na declaração de renda entregue, ainda que pendente a constituição final do montante devido - condição objetiva de procedibilidade -, pelo que a falsidade cometida em meio à fiscalização/apuração do valor sonegado é fato posterior e axiologicamente independente do delito do inc. I do art. 1º da Lei 8.137/1990:
“Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: (...) omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias”.
A finalidade de iludir o Estado, afastando a responsabilidade penal, não se confunde com a de sonegar, já executada e consumada.
E essa falsidade posterior também não tem como ser absorvida pelo crime do inc. IV do art. 1º da Lei 8.137/1990 -“constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: (...) elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato”, em que os documentos falsos devem ser usados para instruir desde já a declaração de renda.
Sendo autônomo o falso praticado em meio à fiscalização, o parcelamento/quitação integral do devido em nada influi na persecução penal quanto a esse crime.
Ainda há se ver que quando terceiro - geralmente profissional da área de saúde - emite os recibos ideologicamente falsos apresentados pelo contribuinte no procedimento fiscal, não tem por finalidade sonegar, afinal esta conduta já foi praticada, mormente quando remunerado pela emissão dos documentos extemporâneos e falsos. Assim, esse terceiro deve responder pela falsidade, não podendo sua conduta ser considerada absorvida pela sonegação.
Eis exemplos desses precedentes da 4ª Turma:
“PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ART. 2º, I, DA LEI Nº 8.137/90. USO DE DOCUMENTO FALSO. ART. 304 DO CÓDIGO PENAL. ABSORÇÃO. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA NÃO DEMOSTRADA. ORDEM DENEGADA.
1. Não se apresenta juridicamente possível o trancamento da ação penal com fundamento no pagamento parcial de débitos, pois somente a quitação integral da dívida possibilitaria a adoção de tal medida.
2. Não há que se falar, no caso ora em comento, na absorção do delito de falso pelo previsto no art. 1º da Lei nº 8.137/90, uma vez que, em uma análise preliminar, conforme narrado na denúncia, a prática do crime de uso de documento falso não foi motivada pelo desejo de consumar o crime contra a ordem tributária, mas a intenção do agente, com a prática do falso, foi eximir-me de qualquer responsabilidade penal.
3. A jurisprudência desta turma é no sentido de que em sendo o falso praticado em data posterior à consumação da sonegação fiscal, com o propósito de acobertar a existência desse último, não há que se falar em absorção. Precedentes do STJ.
4. Habeas Corpus denegado” (TRF1, 4ª T., rel. conv. Juíza Fed. Rosimayre Gonçalves de Carvalho, e-DJF1 18/01/2010, p.36).
“PENAL. PROCESSO PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. REJEIÇÃO DE DENÚNCIA. ART. 304 C/C 299 E ART. 299, DO CÓDIGO PENAL. ABSORÇÃO PELO CRIME DE SONEGAÇÃO FISCAL. ART. 1º, I, DA LEI 8.137/90. INOCORRÊNCIA. RECURSO PROVIDO.
1. No caso em comento, tendo em vista que a suposta apresentação dos documentos contrafeitos teria se dado em momento posterior à prática do delito fiscal, resulta que, em princípio, o delito de falso não foi o meio necessário ou normal fase de execução do crime de sonegação fiscal. Por conseguinte, não há que se falar na absorção dos delitos capitulados nos arts. 304 c/c 299 e 299, ambos do Código Penal, pelo delito previsto no art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90, considerando que a intenção dos agentes, com a suposta prática do falsum, em um exame primeiro, inerente a presente fase do processo, foi a de se eximir de responsabilidade penal, assim como, em relação ao profissional da área de Psicologia, buscou-se auferir lucro indevido com a emissão de notas fiscais indicadas como falsas. Precedentes jurisprudenciais do egrégio Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal Regional Federal.
2. O egrégio Supremo Tribunal Federal, na linha do posicionamento aqui adotado, tem precedente jurisprudencial entendendo pela não aplicação do princípio da absorção quando o crime de falso possui potencialidade lesiva ampla, que não se esgota na prática do crime tributário.
3. A denúncia oferecida em desfavor dos ora recorridos (fls. 02-A/04-A), referente aos crimes de uso de documento falso e falsidade ideológica, preenche os requisitos do art. 41, do Código de Processo Penal, não havendo que se cogitar, portanto, em ausência de justa causa para instauração da ação penal.
4. Decisão recorrida reformada.
5. Recurso em sentido estrito provido” (TRF1, RSE 200538000452955, 4ª T., rel. Des. Fed. I´talo Fioravanti Sabo Mendes, e-DJF1 05/06/2009, p. 143).
No entanto, a 3ª Turma do TRF1 possui entendimento diametralmente oposto: pela absorção do delito posterior de falsidade pelo crime de sonegação, considerando que aquele seria exaurimento deste, desdobramento da finalidade de sonegar - ver, p.ex., HC 2009.01.00.009019-4/MG e RSE 2007.38.00.020571-5/MG.