quinta-feira, 29 de abril de 2010

Anteprojeto de Reforma do CPC

O sítio do Superior Tribunal de Justiça noticiou na data de hoje que "a comissão de juristas designada pelo Senado Federal para a elaboração do anteprojeto do novo Código de Processo Civil (CPC), que tem como presidente o ministro Luiz Fux, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), encontra-se na reta final de trabalho".

Disse ainda que, "na reunião desta quarta-feira (28), em Brasília, o grupo analisou as propostas, exclusivamente, das entidades relacionadas aos operadores do Direito que podem ser acolhidas, continuando o trabalho iniciado na terça-feira (27), quando foram avaliadas as sugestões apresentadas pelos cidadãos. A comissão definiu, ainda, novos instrumentos que passarão a vigorar no CPC, tais como o incidente de coletividade e a possibilidade de concessão de liminar para o autor de uma determinada ação que tenha direito líquido e certo sobre a outra parte".

O incidente de coletividade busca a resolução uniforme de casos com idênticos fundamentos e pedidos, por parte dos tribunais locais. Podendo, em casos que tais, o Superior Tribunal de Justiça ou o Supremo Tribunal Federal determinar - desde que devidamente provocados - a suspensão “de todas as ações, de todos os recursos sobre o caso em tramitação em todo o território nacional”.

Estuda-se também a possibilidade de criação de um outro instrumento que viabilize "a concessão liminar com base no direito líquido e certo de um cidadão que seja autor de uma determinada ação em relação a um particular".

Além disso, o projeto proporá a extinção de inúmeros recursos existentes atualmente, entre eles o agravo retido e os embargos infringentes, para admitir um único recurso por instância e, com isso, proporcionar maior celeridade.

O antreprojeto também prevê "a inovação na comunicação das ações possessórias em áreas invadidas por movimentos sociais, o aumento da punição ao litigante de má-fé e uma nova forma de intimação da parte que abandona o processo", bem como a aplicação de maior punição ao ligante de má-fé, no intuito de “desestimular aventuras judiciais e atitudes desleais entre os litigantes”.

Fonte: Notícias do STJ (28.04.2010) e Valor Econômico (Mudanças em norma processual darão maior efeito a decisões do STJ), matéria publicada em 27.04.2010.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Tráfico de drogas, substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos - estudo sobre julgamento do HC 975256/RS do STF.

O informativo 579 do STF traz que, no habeas corpus 975256/RS em julgamento no Pleno, o Min. Ayres Britto, o relator, externou voto no sentido da inconstitucionalidade da vedação, em crimes de tráfico de drogas, à substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, restrição presente no § 4º do art. 33 e no conjunto de proibições do art. 44, ambos da Lei 11.343/2006.
Do informativo:

“(...) Após mencionar o disposto no inciso XLIII do art. 5º da CF (‘a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;’), afirmou ser possível vocalizar, daí, uma primeira proposição interpretativa, qual seja, a de que, em tema de vedações de benefícios penais ao preso ou, então, ao agente penalmente condenado, a Constituição Federal impôs à lei que verse por modo igual os delitos por ela de pronto indicados como hediondos e outros que venham a receber a mesma tarja, sem diferenciação entre o que já é hediondo por qualificação diretamente constitucional e hediondo por explicitação legal, ou por descrição legal. Portanto, frisou ter-se isonomia interna de tratamento, antecipadamente assegurada pela nossa Magna Carta. Observou, em seguida, que embora a Carta Federal tenha habilitado a lei para completar a lista dos crimes hediondos, a ela impôs um limite material, qual seja, a não concessão dos benefícios da fiança, da graça e da anistia para os que incidirem em tais delitos. Assim, enfatizou que a própria norma constitucional cuidou de enunciar as restrições a serem impostas àqueles que venham a cometer as infrações penais adjetivadas de hediondas, não incluindo, nesse catálogo de restrições, a vedação à conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos. Acrescentou que, nessa regra de parâmetro, a Constituição fez clara opção por não admitir tratamento penal ordinário mais rigoroso do que o que nela mesma previsto, subtraindo do legislador comum a possibilidade de estabelecer constrições sobejantes daquelas já preestabelecidas pelo próprio legislador constituinte, em consonância com o postulado de que a norma constitucional restritiva de direitos ou garantias fundamentais é de ser contidamente interpretada, inclusive quando de sua primária aplicação pelo legislador comum”.

Cumpre destacar do posicionamento do Min. relator que, primeiro, sustenta a seguinte constatação: não existem crimes equiparados a hediondos. O que há é um rol constitucional de tais crimes - tráfico de entorpecentes, tortura e terrorismo -, e outro rol legal. Consequência, tem-se que o primeiro, previsto expressamente no inc. XLIII do art. 5º do Texto Constitucional, é imutável, eis que cláusula pétrea. O segundo, deixado seu preenchimento a cargo da lei infra-constitucional, é mutável. Mas, feita essa distinção, ambas as categorias de crimes hediondos devem ser submetidas às mesmas restrições da norma constitucional, a serem concretizadas por meio de lei: inafiançabilidade e insuscetibilidade de graça e anistia. Daí o relator ter concluído que a vedação à substituição da pena estaria extrapolando o determinado pelo constituinte de 1988, eis que não se conecta a nenhuma das restrições da norma constitucional em comento.

O Min. relator expressou que o tema substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos liga-se, em verdade, ao inc. XLVI do art. 5º do Constituição Federal que, trazendo disposições sobre a individualização da pena, prevê, expressamente, “prestação social alternativa” e “suspensão ou interdição de direitos”.

Apesar da vedação à liberdade provisória no tráfico de drogas – outras das restrições do art. 44 da Lei 11.343/2006, não ser objeto do habeas corpus em questão, é defensável, tendo o entendimento do Min. Ayres Brito como ponto inicial, o seguinte raciocínio: não se pode confundir as duas restrições em discussão, pelo que afastada a que tange às penas alternativas, tal não pode ser elastecido à referente à liberdade provisória, mormente quando as normas constitucionais regedoras também são distintas. Note-se, a impossibilidade de liberdade provisória deflui da inafiançabilidade constitucional, ambas incidindo concretamente no status libertatis antes de haver trânsito em julgado. Porém, o mesmo não pode ser dito quanto ao óbice legal à substituição da pena, eis que a modalidade de sanção a ser aplicada toma contornos finais tão-somente com a coisa julgada, seguindo-se a fase da execução penal.

Outra conseqüência lógica do raciocínio do relator é que se a lei deve dispensar o mesmo tratamento aos crimes constitucionalmente qualificados como hediondos e aos crimes legalmente qualificados como hediondos, não há base constitucional para a concessão de liberdade provisória nessa segunda categoria de delitos, eis que sobre ela também incide a inafiançabilidade. Veja-se o que diz o comando constitucional: “a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos (...)” – destacou-se. Assim, percebe-se que o entendimento, construído a partir da edição Lei 11.464/2007, pela possibilidade de liberdade provisória nos crimes legalmente hediondos, destoa da letra constitucional.

Em tempo, no STJ prevalece a tese de que a vedação à substituição da pena no crime de tráfico de drogas é constitucional, mas naquela Corte superior já há precedente - ver HC 149670/MG, 5ª T., rel. Min. Laurita Vaz, DJe 29/03/2010, em que, denegada a ordem, foi registrado o acompanhamento do julgamento do HC 975256/RS no STF.

Feitas as considerações acima, resta esperar a conclusão do julgamento do HC 975256/RS e a repercussão das razões de seu resultado, registrando-se, desde já, que a possibilidade de substituição da pena aos agentes da traficância em si – art. 33 da Lei Anti-drogas de 2006, somente se concretiza se a pena for fixada dentro dos limites do art. 44 do Código Penal, i.é., abaixo do mínimo legal de cinco anos, o que pede a ncidência da causa de diminuição do § 4º do mesmo art. 33.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Síndrome da talidomida - indenização por danos materiais e morais.

A talidomida é uma substância química com várias aplicações medicinais. Passou a ser usada, em fins da década de 1950, para combater o enjôo de mulheres grávidas. É derivada do ácido glutâmico e composta pela mistura equivalente de dois isômeros ópticos (mesmas propriedades químicas e físicas, mas refletem a luz de forma diferente, possuindo efeitos fisiológicos distintos): o S(-) e o R(-). O R é o responsável pelas propriedades relevantes contra o enjôo típico da gravidez.
O problema é que a Legislação, no início da comercialização do medicamento e no mundo em geral, não era tão rigorosa quanto aos testes necessários à liberação de remédios aos consumidores, pelo que os laboratórios da época, concentrando-se no isômero R, não verificaram que o S possuía efeitos teratogênicos, ou seja, levava à má-formação dos fetos, acarretando atrofia de membros.
Apenas nos idos de 1962, após o registro de milhares de casos de má-formação, é que a talidomida foi removida da lista dos remédios de uso indicado na gravidez. Trata-se de um dos maiores erros da indústria farmacêutica e dos governos, pois o medicamento foi prescrito a grávidas de vários países.
Recentemente é que a ciência conseguiu identificar o mecanismo exato de ação da talidomida nos fetos: o isômero S inativa a enzima cerebron, essencial nos primeiros meses de gravidez para a formação dos membros da criança.
Atualmente, a talidomida, observada a vedação às grávidas, é usada no tratamento de doenças como lúpus e para diminuir os riscos de rejeição em transplantes de medula. E vem sendo usada em estudos de novos tratamentos para, p.ex., o câncer.
No Brasil, houve casos de má-formação pelo uso de talidomida. Há registros de que o medicamento foi receitado a grávidas no país mesmo após a substância ter o uso vedado, internacionalmente, durante a gravidez.
Tenha-se em mente que a má-formação em questão é tida por congênita, no entanto não se trata de determinação genética pura. Houve a introdução de agente mutagênico no mercado brasileiro por omissão estatal, pelo que os danos daí oriundos devem ser indenizados pela União, a responsável pela fiscalização de medicamentos. Nesse contexto foi editada a Lei 7.070/1982, que instituiu, em seu art. 1°, o dever da União em pagar “(...) pensão especial, mensal, vitalícia e intransferível, aos portadores da deficiência física conhecida como ‘Síndrome da Talidomida’ que a requererem (...)”, a contar da data do pedido administrativo.
Essa pensão, apesar de ter o pagamento operacionalizado pelo INSS - o sucessor do INPS, não possui caráter previdenciário, mas sim indenizatório, pois cabe ao Estado omisso indenizar as vítimas da talidomida pelos danos materiais suportados do início ao fim de suas vidas. E essa natureza indenizatória é explicitada pela própria Lei 7.070/1982 que traz, no § 1º de seu art. 3º, que a percepção dos valores indenizatórios não se confunde com o recebimento de benefício previdenciário, eis que aqueles têm por causa a omissão estatal e este a perda de capacidade laboral. É que o grau de deficiência decorrente da talidomida varia, mas sempre existe o dano que deve ser indenizado por meio da pensão. E, a depender do grau das dificuldades da vítima, há margem para benefício previdenciário. Tanto é assim que a Lei determina que se há aquisição de capacidade para o trabalho após a concessão da pensão indenizatória, isto não implica em minoração desta.
Apesar de já determinado pela Lei o dever em indenizar os danos materiais, não há empecilho para que vítima da talidomida venha a processar a União, visando a indenização a ser paga de modo que não o determinado pela Lei 7.070/1982, pois não se pode olvidar que, à luz do § 6º do art. 37 da Constituição Federal de 1988, não há necessidade de lei infraconstitucional para que se configure o dever estatal em indenizar, bem como que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” – inc. XXXV do art. 5º da Constituição Federal. No entanto, a vítima deverá fazer opção por apenas uma das verbas – ver o caput do art. 3º da Lei em tela, pois o dever da União em indenizar o dano material não pode gerar dupla obrigação. Mas não confundir a indenização pelo Estado com aquela devida pelo laboratório que introduziu o medicamento no mercado brasileiro. Tais verbas são cumuláveis, pois a omissão estatal e o erro original do laboratório são distintos, ainda que o primeiro tenha perpetuado o segundo, pois a empresa farmacêutica não faz parte da Administração Pública. Assim, se “a vítima da 'Síndrome da Talidomida', que recebe pensão especial paga pelo INSS não pode cumular indenização a ser paga pela União”, “não há impedimento legal à apuração da responsabilidade dos laboratórios envolvidos” - TRF2 - AG 9702170052, 3ª T., rel. Des. Paulo Barata, DJU II 28/08/2001.
De natureza indenizatória, a pensão da Lei 7.070/1982 repele o conceito de renda tributável, pelo que não há que se falar em incidência do imposto de renda nessa verba. Nesse sentido, ver AC 200734000160217, TRF1, 8ª T., rel. Des. Fed. Maria do Carmo Cardoso, e-DJF1 09/10/2009, p. 781. Com acerto, se não há acréscimo patrimonial, é caso de não-incidência tributária – que não se confunde com isenção fiscal -, o que não precisa ser objeto de Lei, vez que decorre diretamente da sistemática tributário-constitucional. As hipóteses de isenção fiscal é que necessitam ser discriminadas legalmente. Nesse tópico específico, a Lei 11.727/2008, ao inserir o art. 4°-A na Lei 7.070/1982, isentou, expressamente, de imposto de renda a pensão sob exame. Há que se ver que, pelo há pouco exposto, a Lei disse menos do que deveria.
Noutro ponto, de trato sucessivo, a pensão da Lei 7.070/1982 não está sujeita a prazo prescricional para se ir a Juízo, ainda que se possa falar em prescrição qüinqüenal quanto aos atrasados, conforme registrado pelo Superior Tribunal de Justiça - ver REsp. 200200802335, 1ª T., rel. Min. Denise Arruda, DJU I 24/04/2006, p. 354.
Do até aqui exposto, tem-se que a Lei da década de 1980 disciplina o dever da União em indenizar os danos materiais decorrentes da síndrome da talidomida, mas nada dispõe sobre os danos morais, apesar de elementos dessa Lei terem sido usados no cálculo judicial da indenização moral: “(...) devida a indenização por danos morais, fixada em uma única vez, e paga pela União, no valor correspondente a 20 vezes o valor que cada uma das vítimas da síndrome da talidomida, nascidas entre 1966 e 1998, vem recebendo como pensão especial em razão da Lei n.º 7.070/82 (...)” – TRF3, APELREE 199961000174175, rel. Des. Fed. Roberto Haddad, DJF3 CJ2 23/04/2009, p. 513.
Há julgados que condicionam a ação por danos morais em questão a prazo prescricional: “(...) na hipótese, o autor ajuizou ação pretendendo a reparação dos danos materiais, físicos, estéticos e morais decorrentes da omissão estatal na fiscalização da utilização do medicamento Talidomida, que teria sido consumido por sua mãe durante sua gestação, causando-lhe, no autor, graves deformidades físicas, além de problemas cardíacos e de visão. O prazo prescricional contra a Fazenda Pública, mesmo em ações indenizatórias, rege-se pelo Decreto 20.910/32. Tendo, o autor, nascido em 26/12/1957 e, portanto, completado 16 anos em 26/12/1973, quando passou a ser relativamente capaz, a partir desta data se iniciou o transcurso do lapso prescricional, razão pela qual a pretensão já se encontrava prescrita quando do ajuizamento da demanda, em janeiro de 2004. Precedentes. Recurso improvido (...)” – TRF2 - AC 200451100001893, 8ª T. E., rel. Des. Fed. Maria Alice Paim Lyard, DJU II 23/04/2009, p. 19.
Porém, há posição jurisprudencial que conecta o prejuízo moral das vítimas da talidomida aos direitos de personalidade, imprescritíveis, bem como ao próprio direito à vida: “(...) No que diz respeito à prescrição, precedentes desta Corte e do Superior Tribunal de Justiça assentaram a imprescritibilidade dos denominados ‘direitos da personalidade‘, como no caso de danos morais por violação de direitos humanos. (...) A grave omissão do Estado em zelar pela saúde dos seus cidadãos, como no caso em julgamento, compromete seriamente o seu direito à vida plena, de forma violar o inciso III da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), segundo o qual toda pessoa tem o direito à vida. (...) As deformações e limitações produzidas pelo uso inadequado da Talidomida, sem dúvida alguma, afetam seriamente os direitos da personalidade, cuja reparação goza da imprescritibilidade. (...) Desta maneira, fica afastada a alegação de prescrição, não se aplicando as disposições do Decreto 20.910/32. (...) Existem evidências de que, nas décadas de 1950 e 1960, as autoridades do Ministério da Saúde demoraram a proibir o uso deste medicamento, mesmo quando já eram amplamente conhecidos os seus efeitos teratogênicos. (...) Fica evidente que houve falha (‘faute du service’) das autoridades sanitárias ao não impedirem que a Talidomida fosse comercializada no Brasil até o ano de 1965, quando seus efeitos nefastos sobre os fetos já eram conhecidos da comunidade científica mundial, acarretando, em conseqüência, a responsabilidade pela indenização por dano moral às suas vítimas. (...) É inarredável que as deformações provocadas por referido medicamento limitam enormemente a vida das suas vítimas, além de expô-las a constrangimentos no seu cotidiano, suscitando o direito à indenização por danos morais, independentemente da percepção da pensão especial da Lei 7.070/82 (...)” - TRF3 - APELREE 200261000287967, 3ª T., rel. Des. Fed. Rubens Calixto, DJF3 CJ1 21/07/2009, p. 73.
Em 2010 foi editada a Lei 12.190, que traz o dever da União em indenizar o dano moral decorrente da síndrome da talidomida. Essa indenização deve ser paga em uma única parcela de cinqüenta mil reais, podendo ser aumentada de acordo com o grau de má-formação. Essa Lei teve o cuidado de explicitar que sobre essa verba não incide imposto de renda o que se mostra dentro da boa técnica jurídica, já que não é hipótese de isenção tributária e sim de não-incidência. Ainda, traz que é cumulável com a pensão vitalícia da Lei 7.070/1982, o que se mostra coerente, pois uma visa a indenizar os danos materiais, a outra, os morais. E essa Lei de 2010, em seu art. 5º, dispõe que nada impede que a parte vá a Juízo contra a União, pleitear indenização por danos morais a ser calculada de forma diversa da legalmente prevista, desde que opte por uma das verbas, em face da vedação à já referida dupla obrigação. Essa previsão legal de busca ao Judiciário, em verdade, apenas veicula o óbvio decorrente do inc. XXXV do art. 5º e do § 6° do art. 37 da Constituição Federal. E a vítima pode mover ação por danos morais contra o laboratório responsável pelo erro farmacêutico, sendo a indenização daí decorrente cumulável com a paga pela União, nos mesmos termos acima expostos.
Importa destacar que a Lei 12.910/2010 não fala, sequer, em prazo para requerimento administrativo. Apenas dispõe, no caput de seu art. 1º, que “é concedida indenização por dano moral às pessoas com deficiência física decorrente do uso da talidomida, que consistirá no pagamento de valor único igual a R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), multiplicado pelo número dos pontos indicadores da natureza e do grau da dependência resultante da deformidade física (§1º do art. 1º da Lei no 7.070, de 20 de dezembro de 1982)” - destacou-se. Assim, s.m.j., quanto à indenização delineada pela Lei 12.910, não há que se falar em prescrição administrativa - que não se confunde com a prescrição judicial, ou seja, não há prazo para que a vítima procure a Administração, pois esta é que, imperativamente, deve pagar a indenização. E ainda que a Lei traga que produz efeitos financeiros a contar de 1º de janeiro de 2010, tal data deve ser considerada como o marco, do ponto de vista da disponibilidade de recursos, para a União poder começar a pagar o devido e não como início de contagem de lapso prescricional, administrativo ou judicial. Por conseguinte, com base na sistemática da própria Lei, se a vítima preferir acionar a União judicialmente, não aceitando a indenização ex legis por danos morais, não há que se falar em prazo prescricional correndo contra o direito de ação, mormente quando se está diante de pretensão imprescritível, referente aos direitos de personalidade e ao à vida, conforme já se disse.
E nada impede que se leve ao Judiciário insatisfação quanto à aplicação dos critérios de cálculo da indenização por danos morais da Lei de 2010, os do § 1º do art. 1° da Lei de 1982.
Questão interessante, que poderá surgir nos Tribunais, será a referente às situações em que a União já tenha sido obrigada judicialmente a indenizar os danos morais antes da edição da Lei 12.910/2010, mas em quantum inferior ao piso da novel Lei. Nesses casos, há que se responder se o art. 5º da Lei 12.910/2010 - “a indenização por danos morais de que trata esta Lei, ressalvado o direito de opção, não é acumulável com qualquer outra da mesma natureza concedida por decisão judicial” constituir-se-ia, ou não, em óbice a pleito de complementação judicial.

Obs. Dados técnicos coletados no site Wikipédia na rede mundial de computadores - Internet.

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Desvio de recursos do FUNDEF - nova tese no STF: distinções entre a jurisdição cível e a penal quanto à fixação da competência.

O NUCRIM/PRR1 fez o alerta de que, recentemente, decisões monocráticas do STF nas ACO's 1.193/PI e 1.285/SP registraram que quando não há complementação pela União dos recursos do FUNDEF, a competência para a ação de improbidade é da Justiça Estadual.
O que chama atenção nessas decisões monocráticas é que trazem distinção no sentido de que, nesses casos em que não há complementação, a competência para o feito penal, correlato à ação de improbidade, não será da Justiça Estadual, mas sim da Justiça Federal, pois ainda que não haja, em tese, interesse (econômico) da União, nos termos do inc. I do art. 109 da CF/88, em reaver recursos complementares, há interesse (moral) federal - inc. IV do art. 109 da CF/88, na adequada prestação educacional à população.
E o STF - conforme consta em julgados anteriores, citados nas duas decisões em tela - faz a ressalva de que, caso a União manifeste interesse nos autos cíveis, a competência para a ação de improbidade poderá ser deslocada à Justiça Federal - ver decisão na ACO 1.313/SP, rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe-225 divulg. 30/11/2009 public. 01/12/2009.

Notícias do STJ - Videoconferência

"Videoconferência: apenas interrogatório e alegações finais anteriores à Lei n. 11.900 devem ser anulados

A necessidade de anulação dos interrogatórios realizados por videoconferência antes da Lei n. 11.900/2009 tem sido reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) há alguns anos. As Turmas de Direito Penal, no entanto, rediscutiram a questão e alteraram o alcance da nulidade do ato. Os ministros entendem que não há necessidade de anulação de todos os atos subsequentes ao interrogatório, mas apenas do próprio interrogatório e do restante do processo a partir das alegações finais, inclusive.

A posição vem sendo adotada pela Quinta Turma desde o ano passado. A Sexta Turma julgou o primeiro precedente a respeito, no último dia 5 de abril. O relator foi o desembargador convocado Celso Limongi. O desembargador relembrou que a nulidade se justifica pela falta de previsão legal, permitindo a realização do interrogatório pelo sistema de videoconferência.

Na época do interrogatório, em São Paulo, estava em vigor uma lei estadual (Lei n. 11.819/2005) que previa a utilização de aparelho de videoconferência nos procedimentos destinados ao interrogatório e à audiência de presos. Ocorre que o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou inconstitucional a lei paulista, porque a norma invadia a competência privativa da União para legislar sobre direito processual.

A novidade no entendimento recente do STJ é o foco no princípio da instrumentalidade das formas (que evita que sejam refeitos, inutilmente, todos os atos do processo) e na exigência de duração razoável do processo. A partir desses preceitos, os ministros concluíram que “não se justifica, com base em vício existente especificamente no ato do interrogatório, a anulação dos demais atos da instrução, que dele não dependem e, portanto, devem ser preservados”.

O desembargador Limongi invocou o parágrafo 1º do artigo 573 do Código de Processo Penal (CPP), segundo qual, uma vez declarada a nulidade de determinado ato, esta apenas causará a nulidade “dos atos que dele diretamente dependem ou sejam consequência”, não atingindo os atos autônomos e independentes.

A Sexta Turma entendeu que, anulado o interrogatório, outro deve ser realizado e, em seguida, deve ser reaberta a fase de alegações finais. Para os ministros, a realização do interrogatório como último ato da instrução, antes de prejudicar “constitui um benefício para a defesa do réu. Assim procedendo, ela poderá apresentar a sua versão dos fatos com o conhecimento de tudo o que já foi levado aos autos”, sistemática, aliás, hoje adotada pela nova redação do CPP (artigo 400), modificada em 2008.

Precedentes

O caso analisado diz respeito a um condenado pela Justiça Federal por tráfico de drogas à pena de seis anos, nove meses e vinte dias de reclusão. A Defensoria Pública da União recorreu ao STJ, alegando, entre outros pontos, que o processo deveria ser anulado em decorrência da realização do interrogatório por videoconferência, no dia 14 de abril de 2008. A lei que autorizou o sistema é de 18 de janeiro de 2009.

Na Quinta Turma, a posição já foi tomada em vários precedentes. No HC 103742 e no HC 144731, outros dois presos de São Paulo conseguiram o reconhecimento da nulidade dos interrogatórios realizados por videoconferência antes da alteração do CPP. Em novembro, a Turma seguiu o voto do relator, ministro Arnaldo Esteves Lima, na análise do habeas corpus de um condenado por tráfico de drogas pela Justiça Federal.

Os ministros entenderam que o Provimento 74/2007 da Corregedoria-Geral da Justiça Federal da 3ª Região, que dispôs sobre a oitiva do acusado por meio eletrônico, não supriu a ausência de previsão no CPP para a utilização do sistema.

No outro caso, julgado no mês seguinte, a Quinta Turma seguiu os precedentes e concedeu parcialmente a ordem de habeas corpus a outro condenado, este pela Justiça estadual, por tráfico de drogas, resistência e desacato. Os ministros determinaram somente a anulação do interrogatório realizado por videoconferência, bem como do processo a partir das razões finais, inclusive.

Tecnologia

Tal qual todas as áreas da atividade humana, o processo penal também se viu obrigado a aderir aos avanços tecnológicos para não ser atropelado pela obsolescência. “O judiciário não pode ser um excluído digital ou informacional”, ponderou o doutor em Direito Penal Luiz Flávio Gomes. Ele conta que, em 1976, quando era juiz de direito em São Paulo, realizou os primeiros interrogatórios on-line no país.

Para o professor, um defensor das novas tecnologias, “o interrogatório virtual ou mesmo qualquer outro ato processual deve, necessariamente, observar todos os princípios constitucionais (ampla defesa, contraditório, publicidade etc.)”. Gomes adverte que “não se deve nunca imaginar (autoritariamente) que a videoconfrência possa ser utilizada só para agilizar o processo”.

Num primeiro momento, localmente as autoridades judiciárias passaram a utilizar o sistema televisivo nos interrogatórios. Nos moldes do que ocorreu em São Paulo, onde uma lei chegou a ser editada – e depois foi considerada inconstitucional –, no Distrito Federal a videoconferência foi usada como instrumento para audiência de interrogatório.

O caso chegou ao STJ pro meio de um recurso (RHC 24879). O preso era processado pelos crimes de formação de quadrilha e roubo, cometidos em 2001, inclusive em uma agência do Banco de Brasília (BRB). O interrogatório do preso foi realizado por sistema de videoconferência, no dia 24 de abril de 2008 – portanto, antes da alteração do CPP. Por isso, a defesa pediu a sua anulação. O pedido foi negado pelo juiz e, depois, pelo Tribunal de Justiça do DF.

No STJ, a nulidade acabou reconhecida. O relator, ministro Jorge Mussi, afirmou que o ato é nulo. “Não obstante a evolução tecnológica, e em especial na área de informática, não há como se concordar com a realização do teleinterrogatório sem lei normatizando o sistema”. Mas o ministro ressalvou que “o vício” existe apenas quanto ao interrogatório, já que não se constata que tenha contaminado os demais atos subsequentes a ponto de levar à conclusão de que o processo deve ser integralmente anulado.

Previsão legal

A alteração do CPP que introduziu o sistema de videoconferência autoriza, além do interrogatório, a realização pelo mesmo sistema de outros atos processuais que dependam da participação de pessoa que esteja presa, como acareação, reconhecimento de pessoas e coisas, inquirição de testemunha ou tomada de declarações do ofendido.

O CPP prevê, ainda, que testemunhas que morarem fora da jurisdição do juiz poderão ser ouvidas por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real. Nessas hipóteses, é permitida a presença do defensor.

O uso da videoconferência é excepcional e deve ser autorizado por juiz em decisão fundamentada. A medida deve ser necessária para: garantir a ordem pública e prevenir risco à segurança pública (possibilidade de fuga durante o deslocamento, por exemplo); viabilizar a participação do réu no processo, quando for impedido por enfermidade ou outra circunstância pessoal; e impedir a influência do réu no ânimo de testemunha ou da vítima, desde que não seja possível colher o depoimento destas por videoconferência.

Segundo a lei, da decisão que autorizar a realização da videoconferência, as partes deverão ser intimadas com dez dias de antecedência para a realização da sessão. A sala em que a ferramenta estará em funcionamento será fiscalizada pelo Ministério Público, pelo juiz do processo e pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)".

Fonte: Site do Superior Tribunal de Justiça